quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Palmito ecológico prospera com plantios em São Paulo

O mercado de palmito no Brasil sempre foi cercado de ilegalidades. A partir da década de 1960, tornou-se comum a extração da espécie juçara, de alta qualidade, nativa da Mata Atlântica. Como a palmeira começou a rarear, uma outra planta, originária da Amazônia e de características mais sustentáveis, manifestou potencial para ocupar o lugar do juçara: o pupunha. E, curiosamente, é graças à contribuição de uma das regiões mais carentes de São Paulo, o Vale do Ribeira, que a produção desse nobre produto ganha corpo no país.
Situado no sul paulista, o Vale do Ribeira ganhou notoriedade pelas plantações de banana, que hoje somam 48 mil hectares. Entretanto, muitas áreas antes voltadas à bananicultura estão aos poucos sendo direcionadas à pupunha. Estimativas da Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (Cati), da Secretaria de Agricultura paulista, dão conta de que há 7 mil hectares cobertos pelo palmito. Calcula-se ainda que há 36 milhões de pés, o que resulta em uma produção de 22 toneladas anuais. A região já figura entre as maiores na produção de pupunha no Brasil, ao lado de Bahia, Espírito Santo, Rondônia e Pará.

“Nos últimos dez anos, o plantio de banana no Vale do Ribeira registrou uma diminuição de 6 mil hectares, que foi mais ou menos o aumento da área de cultivo de pupunha”, afirma Eduardo Soares Zahn, assistente de planejamento da Cati da cidade de Registro, SP. Segundo Zahn, o custo de implantação das duas culturas não é tão diferente, mas os gastos com manutenção e mão de obra são bem menores com o palmito.
Pupunha na dianteira

Antônio Josué Leite, o “Tozinho”, sempre se dedicou aos bananais, mas há 4 anos apostou na pupunha. Hoje, tem cerca de 2,5 hectares com a fruta em Eldorado, SP, e a mesma área com o palmito. “O trato cultural é mais em conta: se eu gasto R$ 2 reais num pé de pupunha, no de banana eu gasto R$ 5”, compara. A renda também é um fator positivo para o palmito: com três cortes por ano, Tozinho tem ganho no período de cerca de R$ 18 mil.

A prosperidade da pupunha em Eldorado se deve em boa parte à iniciativa do escritório local da Cati, que criou um sistema de apoio aos interessados no palmito. Em 5 anos de existência, o projeto já viabilizou 130 produtores. “O Banco do Brasil já está sem estrutura para acompanhar a nossa demanda, que está bem firme”, diz Antônio Carlos de Melo, engenheiro agrônomo da Cati na cidade.

Por meio de um financiamento de R$ 18 mil, via Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), o agricultor recebe verba para plantio para pouco mais de 2 hectares e tratos culturais para o primeiro corte. Tozinho foi um dos beneficiados e, animado, resolveu dobrar a área.

Com o mercado aquecido, há 2 fábricas em construção no município (que se somarão a outras 8 que já existem na região), além do viveiro Flora do Vale, que produz 600 mil mudas da planta por ano e emprega cerca de 25 pessoas, entre fixos e temporários. “Já vendemos mudas até para Paraná e Santa Catarina”, conta Mário Bresciani, gerente do viveiro.

Diferentemente do juçara, que morre ao ser cortado, o pupunha permite vários cortes e possui crescimento rápido (entre um ano e meio e dois é possível fazer o primeiro corte; com o juçara, esse tempo é de oito anos). O sabor é um pouco diferente do cobiçado palmito da Mata Atlântica: in natura, o pupunha é mais doce (embora em conserva essa característica seja atenuada). “E é mais macio que o palmito de açaí, fruto de extrativismo, que abastece 90% do mercado nacional”, afirma Zahn. Além disso, como o pupunha não escurece após o corte, é possível que o pequeno agricultor faça o produto minimamente processado, oferecendo-o como hortaliça fresca.

Ainda há pouco material científico sobre a pupunha, mas o cultivo é considerado simples. A propagação é feita com mudas, produzidas a partir de sementes colhidas da população nativa, na Amazônia. Algumas pragas têm preocupado os agricultores – a principal delas é a broca.

Por conta de uma certa carência de conhecimentos sobre a pupunha, especialmente em relação aos custos da produção, a produtora Rotilde Aparecida Rodrigues, de Registro, começou ela própria a fazer alguns estudos. Em uma área com 25 mil pés, plantada no ano passado, ela tem anotado todos os detalhes, a exemplo de gastos como mão de obra e adubação. “Daqui a 4 ou 5 anos, vou ter a noção exata da viabilidade desse palmito”, conta ela, que ingressou no setor há 5 anos, e já conta com 93 mil pés plantados.

Preocupada em colocar tudo na ponta do lápis, e tornar sua propriedade financeiramente sustentável, Rotilde batalhou também por uma mudança na forma de remuneração. “Antes, eu vendia por haste, mas o peso, o tamanho e a espessura variam muito. Depois de muito brigar por preço, fiz um trato com os compradores: o valor bom para mim é R$ 3,50 o quilo do produto beneficiado”, diz. Ou seja, se o volume vendido rendeu 100 quilos de pupunha processada, ela recebe R$ 350.
No Vale do Ribeira, os bons produtores conseguem produtividade de 7,5 mil a 8 mil hastes por hectare ao ano, tendo 5 mil plantas em cada hectare. O peso de cada haste de palmito gira em torno de 600 gramas.
Quantidade e qualidade

Além do volume de produção, a preocupação com a qualidade também tem aumentado. Uma iniciativa neste sentido partiu de Khalil Yepes Hojeije, diretor da Palmito Floresta, uma das mais tradicionais processadoras de pupunha do Vale do Ribeira.

A busca pela segurança no consumo é vital aos negócios da empresa, que tem clientes de peso. Com 3 milhões de pés de pupunha e processamento de 2 toneladas por dia, a Palmito Floresta atende os mercados interno e externo, com vendas para Argentina, Chile e França. Além de ter suas próprias marcas, a fornece a companhias como Sadia, Perdigão e a francesa Bonduelle, além de ser responsável pelos palmitos que levam as marcas das redes Carrefour, Makro e Roldão.

Em 2005, Hojeije iniciou um projeto de estudo da qualidade do palmito no país, que culminou na fundação do Instituto Palmito Seguro. “O objetivo é tentar moralizar a comercialização do produto no país, inclusive para evitar que a falta de qualidade interfira na saúde da população [com a propagação de casos de botulismo, por exemplo] e, por extensão, no baixo consumo”, afirma.
A entidade possui uma equipe de especialistas, que deve começar a auditar e certificar unidades produtoras de palmito em breve. “Alguns supermercados já manifestaram interesse em dar preferência a marcas que tenham o selo.

Além da Palmito Floresta, três empresas já demonstraram intenção de se adequar à certificação que criamos”, diz Hojeije. A exigência se justifica pela amplitude do mercado: o Brasil é o maior consumidor de palmito do mundo, com 940 gramas por habitante ao ano – afora o mercado externo, que ainda carece de ser explorado com mais atenção.

Fonte: Revista Globo Rural

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